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Não é de hoje que os filósofos e pensadores denunciam a tendência humana de projetar em Deus suas necessidades de consolo e amparo, como se isso transformasse um humano adulto numa criança perdida.
Não é de hoje que aqueles que acreditam perceberam que Deus não atua diretamente, mas, indiretamente, através das circunstâncias dos acontecimentos.
O que mais tememos é que Deus desapareça se deixarmos de acreditar nas imagens que fizemos dele, capazes de dar conta dos nossos desejos e utopias, num mundo mágico, onde até os milagres de que precisamos virem magia.
O homem de fé não se apoia no milagre para crer e viver. Essa seria uma religiosidade para ser qualificada como infantil.
Impor a Deus nossas necessidades transformaria a fé em evidência. Hegel chamou a isso de objetivação do espírito. Se ainda precisamos de intervenções diretas de Deus, quem seria esse “dono da vendinha universal” onde procuramos e compramos o que nos falta?
Quando um humano, necessitado de constatações imediatas da presença divina, vir que elas não chegam com a frequência que sua fé necessita, não lhe resta mais do que se refugiar numa ação direta e invisível de Deus. Esse seria o mundo sobrenatural regado pela chuva da graça transformada em objetos reais do nosso desejo.
Acontece? Sim. Só precisamos estar prontos para quando não acontecer.
O desafio da religião é que ele exige crescimento. O crescimento consegue admitir que Deus não intervém diretamente, quase diria, mecanicamente no mundo que Ele criou à sua própria imagem, sob o signo de uma liberdade que lhe seja própria, e à qual Ele mesmo irá respeitar.
Esse é o maravilhoso jeito de crer!
O mundo está em nossas mãos, e nas forças da natureza, nós também estamos nas mãos do mundo. E tudo o que existe, vive e repousa nas mãos de Deus.
Dom José Francisco Rezende é arcebispo da Arquidiocese de Niterói.
Foi ordenado sacerdote no dia 10 de novembro de 1979. Especializou-se em teologia espiritual pelo Pontifício Instituto Teresianum, de Roma (1987-1989). Em 2011, o Papa Bento XVI o nomeou arcebispo da Arquidiocese de Niterói. Dom José recebeu o pálio das mãos do próprio Papa.