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Não se pode negar, nem ignorar, que a TV Globo cresce e se sustenta com meios avançados tecnológicos e uma estrutura profissional elevada no cenário brasileiro. O reflexo disto é a qualidade em quase todos os setores do Entretenimento, Esportes, Jornalismo e novelas. Raramente, a TV Globo tem concorrentes no mesmo nível.
O show de aniversário do Grupo Globo foi apoteótico e criativo, com certeza, uma afirmação do seu império na Comunicação.
Tudo foi preciso, sem contradições ou vozes dissonantes, para que fique no imaginário das pessoas um belo conto de fadas.
Quase tentaram explicar o condenável acordo com o grupo Time Life que, na época, investiu uma fortuna para montar a TV Globo.
Na sequência dos quadros do exuberante musical, muitos que por lá passaram foram ignorados. É o caso de José Bonifácio de Oliveira, o Boni, L, um dos cérebros do grupo. Não homenageá-lo é o mesmo que fazer um documentário sobre o futebol no Brasil e não citar Pelé. Por outro lado, resgataram Regina Duarte cujas gargalhadas, como Ministra da Cultura, em plena pandemia da Covid 19, diante da morte e da miséria financeira de milhares de artistas ainda ecoam rasgando o tempo e sua imagem de namoradinha do Brasil.
O setor de Jornalismo na Globo é incontestável do ponto de vista profissional, obviamente, sempre atendendo aos interesses da emissora, quase sempre, resvalando politicamente para tendências do mercado ou para políticas de centro direita.
No show de aniversário dos 60 anos, talvez a omissão mais flagrante foi não ter sido abordado o atrelamento da Globo com a Ditadura Militar de 1964, e seu apoio ao Ato AI5, que censurou, perseguiu jornalistas, artistas e demais críticos à ditadura. Também não foi colocada a maneira que a TV Globo abordou o Movimento Popular, Diretas Já, na Praça Sé, em São Paulo, com mais de 300 mil pessoas, diminuindo o impacto da manifestação.
Nesta narrativa do politicamente correto da festa de aniversário, foi abafado o caso Procunsult. Uma armação da TV Globo com o então candidato ao governo do RJ, Moreira Franco, para detonar Leonel Brizola, favorito da população. O golpe consistia desta empresa Procunsult em informatizar a eleição com transferência de votos nulos e em branco para Moreira, apoiado por militares da Ditadura. Chegaram a publicar uma pesquisa falsa.
Brizola soube da armação e convocou uma coletiva com a imprensa internacional conseguindo abortar o golpe.
Na área do entretenimento, principalmente das novelas, a Globo criou um produto artístico diferencial e de qualidade, de consumo voraz do público e vendável no exterior. Ao longo do tempo, assuntos polêmicos vem sendo abordados na linha do politicamente correto, criando uma imagem de progresso social. Assim foi com o homossexualismo entre homens, depois sobre a questão de gênero com outras nuances. Atualmente, a Globo investe no protagonismo negro: nas novelas, nos programas, no jornalismo. Politicamente correto ou expansão de mercado e audiência?
Até pouco tempo, as pessoas pretas, com raras exceções, ocupavam papéis secundários na TV Globo, eram domésticas, porteiros, marginais, pobres. O caso mais emblemático sobre racismo foi a novela Cabana do Pai Tomaz, em 1969, cujo personagem principal era preto, mas foi interpretado pelo galã branco da época, o ator paraense Sergio Cardoso, que teve o rosto pintado de preto para interpretar o personagem. Foi um escândalo que detonou um movimento contra o racismo na TV liderado pelo dramaturgo Plínio Marcos. Na mesma novela, no entanto, a personagem feminina principal era preta, protagonizada pela atriz Ruth de Souza. No mesmo elenco, as atrizes brancas organizaram um manifesto contra Ruth de Souza com o argumento de que ela estava tirando o lugar das atrizes brancas. O lado positivo foi que o racismo começou a ser discutido dentro da Globo.
Esta prática de pintar o rosto de preto se chama Blackface, sendo que muitos atores usaram deste artifício. A atriz Fernanda Torres também usou blackface. Ela e Sergio Cardoso se arrependeram depois e pediram desculpas públicas.
Enfim, alguns fatos que merecem serem lembrados pelo Sistema Globo de Televisão, grupo que se tornou hegemônico na comunicação brasileira.
Mário Sousa, jornalista, escritor e analista político