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ENTREVISTA: Dom José Francisco Rezende Dias, Arcebispo de Niterói
Na conversa, ele fala sobre o verdadeiro significado da Páscoa e a da importância da fé nos dias atuais.
ENTREVISTA: Dom José Francisco Rezende Dias, Arcebispo de Niterói
Foto do autor Gabriel Ferreira Gabriel Ferreira
Por: Gabriel Ferreira Data da Publicação: 31 de março de 2024FacebookTwitterInstagram
Papa Francisco e Dom José Francisco Rezende Dias - Fotos: Divulgação/ CNBB

Nascido em Brasópolis, Minas, José Francisco Rezende Dias faz 68 anos nesta terça-feira (2). Ele é o Arcebispo de Niterói.

Dom José cursou Filosofia no Seminário Arquidiocesano de Pouso Alegre, em Minas Gerais (1973-1974) e depois Teologia no Instituto Teológico Sagrado Coração de Jesus, em Taubaté, São Paulo (1975-1978).

Foi ordenado sacerdote no dia 10 de novembro de 1979. Especializou-se em teologia espiritual pelo Pontifício Instituto Teresianum, de Roma (1987-1989).

No dia 28 de março de 2001 o Papa João Paulo II o nomeou bispo-auxiliar da Arquidiocese de Pouso Alegre, com a sede titular de Turres Ammeniae. Em 30 de março de 2005 foi nomeado bispo da diocese de Duque de Caxias, sucedendo a Dom Mauro Morelli.

No dia 30 de novembro de 2011 o Papa Bento XVI o nomeou arcebispo da Arquidiocese de Niterói, também presente nas cidades de São Gonçalo, Maricá, Itaboraí, Silva Jardim, Tanguá, Rio Bonito, Araruama, Saquarema, Iguaba Grande, São Pedro da Aldeia, Cabo Frio, Armação dos Búzios e Arraial do Cabo.

Tomou posse no dia 12 de fevereiro de 2012 e recebeu o pálio das mãos do Papa Bento XVI no dia 29 de junho desse mesmo ano.

Às quartas-feiras, o Arcebispo escreve uma coluna em A TRIBUNA, que está entre as mais lidas do jornal. Ele concedeu uma entrevista exclusiva ao repórter Gabriel Ferreira, inaugurando uma série de conversas que o site do jornal passa a publicar aos domingos.

A Páscoa é uma das mais importantes celebrações do ano, pois evidencia a importância da ressurreição de Jesus Cristo em nossas vidas.

De acordo com as escrituras da Bíblia, especificamente no livro de I Coríntios 15:14, o apóstolo Paulo afirma que sem a ressurreição de Cristo, a fé dos cristãos não teria sentido. Neste caso, eles entendem que a morte de Jesus foi um sacrifício para salvar a humanidade de seus pecados. 

A TRIBUNA - Arcebispo, atualmente, a sociedade brasileira vive um momento delicado como desentendimentos e divisionismo. Neste contexto qual é a sua mensagem de Páscoa para esta sociedade?

DOM JOSÉ - Infelizmente, como todos nós podemos constatar, de fato há uma crescente onda de polarização, sobretudo no campo político, que toma conta dos espaços nos quais convivemos, o que afeta radicalmente a nossa convivência, pois frequentemente é causa de divisões e de desentendimentos.

Nesse sentido, a mensagem de Páscoa que ofertamos se baseia no tema da Campanha da Fraternidade deste Ano de 2024 – campanha promovida pela Igreja do Brasil que objetiva a conscientização a respeito de um tema específico –, que nos aponta para a resposta universal para todos as situações de desunião: somos todos irmãos.

A Páscoa significa para nós, cristãos, o momento chave da história humana, no qual Jesus Cristo, por sua paixão, morte e Ressurreição, venceu a morte e o pecado e nos concedeu novamente o acesso ao Paraíso, que havia sido fechado para nós pelo pecado de nossos primeiros pais, garantindo a todos nós que tenhamos nele uma vida nova.

Essa vida nova significa uma verdadeira renovação, que parte do nosso interior para o nosso exterior, do mais profundo do nosso coração para que atinja os corações de todos os irmãos com os quais convivemos. 

Por isso, a verdadeira mensagem para essa Páscoa é que, se quisermos renovar a sociedade, reatando os laços que foram rompidos pelas polarizações, precisamos renovar em Cristo o nosso interior pela força da sua ressurreição em nós. 

Assim, poderemos enxergar o outro como um igual, como irmão que, embora diferente de mim, possui uma mesma dignidade: somos todos filhos de Deus, em sentido amplo.

Foto Divulgação

A TRIBUNA - Neste momento, qual o peso da Fé?

DOM JOSÉ - A fé, como diz a Carta aos Hebreus (11.1), é tomarmos posse de maneira antecipada daquilo que nos espera. A fé nos faz projetar algo para além da realidade sensível que está diante de nós, de modo que somos motivados a depositarmos a nossa esperança nisso que acreditamos. 

Nesse sentido amplo, a fé nos leva a projetar que o mundo em que vivemos pode ser muito melhor do que agora está, e, se tomamos posse dessa realidade, buscamos viver como se já o tivéssemos alcançado. Porém, a fé vivida dessa forma se revela um pouco utópica, porque existe em nós uma realidade objetiva que é comum a todos: o pecado.

Por isso, a verdadeira fé – e aí está o seu peso – se encontra em acreditarmos em Jesus e na sua mensagem de salvação para todos nós. Quando acreditamos nele e temos com ele uma experiência pessoal, aí conseguimos ter a base necessária para superarmos toda a barreira levantada pelo pecado e construirmos o Reino de Deus já aqui na Terra, como preparação para adentramos no Reino preparado para todos nós no Céu.

A TRIBUNA - Como uma pessoa "aprende" a ter fé?

DOM JOSÉ - Talvez em berço religioso, como eu, no qual nossos pais, avós, tios, cuidadores tenham nos ensinado, desde pequenos, os valores religiosos. Nesse caso, a fé tem a capacidade de entrar em nós como por osmose, de modo que assimilemos todos esses valores e compreendamos que fora da fé, vivemos como que tateando no escuro, sem encontrar as verdadeiras felicidade e realização de nossas vidas.

Porém, por muitos motivos podemos, ao longo de nossas vidas, nos desviarmos do caminho da fé, ou melhor, colocando nossa fé em outras coisas e pessoas que não Jesus Cristo. 

Ou até mesmo poderemos não ter conhecido a fé cristã como ela de fato é. Ou ainda podemos ter tido alguma experiência negativa com a fé, seja em relação aos irmãos, seja em relação aos ministros da Igreja. Nesses casos, não há uma fórmula mágica que nos permitirá (re)aprender a ter fé. Porém duas realidades fundamentais para isso.

A primeira das realidades que penso é que devemos compreender que a fé, para esses, deve ser “aprendida” por meio da atração. O cristianismo, se apresentado, se testemunhado da forma correta tem a capacidade de atrair aqueles que dele se aproximam. Mas isso não basta – e aqui é a segunda coisa – é a abertura do coração. Sem a abertura, não há encontro com Cristo, pois ele respeita a nossa liberdade.

Foto: Divulgação

A TRIBUNA - O senhor percebe que as pessoas estão buscando mais a Deus neste momento?

DOM JOSÉ - Acredito que, sobretudo motivadas pela experiência da pandemia, muitas pessoas têm recorrido à espiritualidade como caminho de equilíbrio interior. Podemos dizer se há uma busca por Deus? Para muitos, sim; para outros, não. Muitos podem estar fazendo a experiência de Santo Agostinho, grande santo da Igreja, que procurava experimentar a Deus através de realidades e de caminhos que não eram os dele, mas que o encontrou quando olhou para dentro do seu coração. 

Esses sim estão buscando a Deus, mesmo que não saibam disso. Outros têm modelado Deus segundo aquilo que é conveniente ao seu modo de pensar: um deus de supermercado. Esses não estão buscando a Deus, de fato, mas buscando a realização de si mesmos, tendo Ele como um fantoche.

A TRIBUNA - Para o Senhor, qual o significado da Semana Santa?

DOM JOSÉ - Em relação ao significado da Semana Santa, tem um significado muito objetivo: é a expressão máxima do amor de Deus, desse Deus que não parou o seu olhar em nossas limitações, mas nos amou até o fim. 

É expressão desse Deus que, vindo ao nosso encontro, deixando a si mesmo como alimento na Última Ceia, sofrendo todas as todas as torturas e flagelos antes de morrer na Cruz, levou a salvação a todos nós por meio de sua ressurreição, garantindo a cada um de nós a vida.

Agora, para mim, a Semana Santa possui um significado particular, pois, como arcebispo, sou convidado, de forma particular, a me unir a Cristo em todos os mistérios que nós celebramos: a Ceia, estou ali com Ele oferecendo a mim mesmo na Eucaristia; na Cruz, sou com Ele crucificado; na ressurreição, também eu saio com Cristo do sepulcro. Porque isso faz parte da vida que nós, que assumimos o sacerdócio de Cristo na sua plenitude, devemos viver: estarmos plenamente unidos a Cristo.

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