Imagem Principal
Imagem
Desleixo, 'gatos' e clima são causas dos apagões no RJ
A TRIBUNA ouviu especialistas para entender os problemas que o estado vem vivendo com abastecimento de energia
Desleixo, 'gatos' e clima são causas dos apagões no RJ
Foto do autor João Eduardo Dutra João Eduardo Dutra
Por: João Eduardo Dutra Data da Publicação: 20 de janeiro de 2024FacebookTwitterInstagram
Fonte: Agência Brasil/EBC

O início do ano é marcado por diversos aspectos no estado do Rio de Janeiro. Férias escolares, altas temperaturas, pancadas de chuva e, infelizmente, falta de energia.

O primeiro mês de 2024 ainda nem acabou, mas as notícias sobre locais sem luz por horas, ou até dias, se empilham na Região Metropolitana.

Os problemas de falta de energia infelizmente se tornaram corriqueiros para a população do Leste Fluminense. Basta chover um pouco mais forte que é quase certo que a inconveniência da falta de luz vai acontecer.

Para o professor de Engenharia Elétrica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Antônio Guilherme Garcia, o problema não está na produção de energia e sim em sua distribuição.

“Não está faltando energia. Está claro que você tem usinas suficientes, então é importante separar. O problema está na distribuição”, afirma o professor de engenharia.

Para ele, um dos grandes problemas que o abastecimento de energia sofre é o furto de energia, uma vez que as concessionárias se preparam pensando no número de clientes que eles têm, claro, com uma certa margem extra, mas a super utilização pode acarretar problemas no sistema. 

Além disso, Antônio também cita as condições climáticas como altas temperaturas e fortes chuvas que podem impactar nos serviços.

Outro fator citado é o tempo de resposta das equipes das concessionárias para realizar os reparos e manutenção. 

Para Antônio, essas empresas têm que ter uma logística melhor para atender as situações de falta de energia.

“As concessionárias precisam ter informação de inteligência, de previsão de catástrofes, de chuvas e etc. 

"Essa é uma informação que as empresas deveriam levar em consideração e ter suas equipes preparadas e posicionadas em locais que possam ser atingidos. Mas tem que ter o material necessário também. 

"Não adianta a equipe chegar no local e descobrir que quebrou o isolador e eles não terem no caminhão, aí não resolve nada”, comenta o professor da UERJ.

Segundo dados do Ministério de Minas e Energia do Brasil, o país quebrou o recorde de geração elétrica em 2023, atingindo a marca de 10,3 gigawatts (GW) de produção. 

Ainda assim, as empresas de distribuição de energia ainda foram as mais acionadas na Justiça no ano passado.

O que urge a questão, o que fazer em relação a tantos problemas de distribuição de energia?

O professor do Departamento de Direito Público da Universidade Federal Fluminense (UFF), Gustavo Sampaio, explica que os contratos das fornecedoras de energia são feitos através de concessão pública com o Governo Federal.

“O contrato de concessão é um contrato celebrado entre o prestador de determinado serviço particular e o poder público. 

Portanto, decorre de uma delegação do poder público ao particular para que ele cumpra um papel que, em verdade, pertence ao poder público.

“Como nós sabemos que o poder público não tem condições estruturais de capacidade institucional de fazer tudo com que ele se compromete. 

"Existe uma legislação que rege concessões e permissões de serviços públicos em muitos serviços, como, por exemplo, o serviço de abastecimento de energia”, explica o professor.

O fornecimento de energia é de responsabilidade da União, portanto quem faz a delegação dos prestadores de serviço, através das concessões, é o Governo Federal, mas como tais serviços acometem diretamente aos municípios, cabe a eles realizar o trabalho fiscalizatório.

Tais empresas, que são responsáveis pelas concessões, são remuneradas através da cobrança de tarifas em um contrato regido pelo Direito Administrativo pois envolve o poder público e o destinatário é a sociedade. Segundo Gustavo Sampaio, tal acordo deve seguir parâmetros rígidos fixados na legislação.

“O destinatário é o cidadão. Então, tem que ter o máximo de transparência pública para que o cidadão tenha acesso às cláusulas do contrato quando ele quiser. 

"Ter acesso às informações que regem aquela relação entre o particular e o poder público para que, portanto, se possa ter máxima publicidade.

“Além disso, devemos considerar também que ele deve ser precedido de uma licitação, aquele procedimento administrativo que se instaura para se escolher o melhor para administração pública, quem tem o melhor preço, quem tem as melhores condições de prestação de serviço, quem mais fará bem ao interesse público”, comenta Gustavo.

Porém, apesar de ser um contrato celebrado entre duas partes, Gustavo explica que tal acordo deve ter um desequilíbrio natural, uma vez que uma das partes é o poder público, que representa os cidadãos. 

Diferentemente de outros contratos celebrados em outras esferas, que se assume uma igualdade de condições entre quem assina, a concessão deve trazer mais vantagens para a sociedade, não vice-versa.

“Se a prestadora de serviço está ganhando, está recebendo, está querendo o lucro, que é legítimo, mas não está entregando a contraprestação que se espera, aquele contrato pode ser denunciado para que ele seja cessado, para que em seu lugar, o prestador mais competente do serviço possa executar o serviço em nome do interesse público”, afirma o professor de direito.

Portanto, se a fornecedora de energia apresenta repetidas falhas na prestação de serviço, a administração pública pode sim encerrar seu contrato. Gustavo ainda explica o como o cidadão deve fazer suas reclamações, a modo de que elas sejam ouvidas.

“O cidadão tem toda possibilidade, por exemplo, de levar ao conhecimento do Ministério Público, a quem compete a tutela dos interesses difusos e coletivos e dos interesses sociais, informação sobre essa renovação contratual para que a renovação não seja feita. 

"É claro que a administração pública, que tem autoridade para renovar o contrato, não é o Ministério Público.

“Mas se for demonstrado que essa renovação opera efeitos lesivos ao interesse público, uma vez que a empresa não fazia jus à renovação porque ela já vinha cometendo falhas sistemáticas no desempenho prestacional do serviço, o próprio Ministério Público, por exemplo, poderá mover uma ação civil pública para impedir que a administração pública celebre um contrato lesivo ao interesse público”, diz Gustavo.

Mas o professor de direito ressalta que para tal ação ocorrer tem que ficar comprovada a lesão ao interesse público. Tem que ficar demonstrado cabalmente que o interesse público está sendo violado.

Relacionadas